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Sistema Integrado: uma ideia que deu certo

A minha história na informática começou pouco depois de ter concluído a graduação em Administração de Empresas, na FGV, em 1965. O curso serviu de base para toda a minha vida profissional, mas também me mostrou que administrar é algo muito subjetivo.

Talvez aquele comerciante do Bom Retiro, que mal tinha completado o curso primário, tivesse mais capacidade para administrar uma empresa do que eu, que estava um pouco angustiado, aflito, aborrecido, afobado, ansioso, apreensivo, agoniado – o que chamamos de “os sete As” do inicio de uma carreira. Não conseguia visualizar muita ciência na arte de administrar. Só via experiência.

Passando um dia pela Av. Brigadeiro Luís Antonio, em São Paulo, um menino me entregou um folheto que anunciava: “Cursos de Programação para Cérebros Eletrônicos”. Já tinha ouvido falar, mas não fazia a mínima ideia do que era aquilo. Perguntei onde ficava e o menino me indicou uma escada. Subi, e lá chegando, a secretária disse:

_ Começou hoje um Curso de Programação Autocode 1401. Se você quiser, faz duas horas que o professor iniciou a primeira aula.

Na mesma hora, entrei na sala de aula. Nesse momento, o professor estava ensinando o comando “If. O exemplo que ele usava era o seguinte: se salário for maior do que teto, paga imposto. “Se não” for maior, não paga. A máquina, por meio de um comando de programação, tomava a decisão de descontar ou não o imposto.

Naquele momento, surgiu uma ideia na minha cabeça: se o computador é capaz de tomar uma decisão como essa, certamente ele é capaz de administrar uma empresa. Precisamos apenas colocar todas as regras em um programa. Foi aí, também, que conclui que a administração pode ser uma ciência exata, bem definida e lógica.

Percebi que nós podemos, por meio da inclusão de um conjunto de instruções no computador, fazer com que ele amanhã – isso ainda é um sonho – venha a substituir o ser humano na maior parte das tomadas de decisão. Comecei, então, a trabalhar com empresas que mexiam com sistemas. No entanto, naquela época, era muito ousado pensar em informática.

Tudo era muito caro, coisa de gente grande. Eu saí da OECI (Organizadores, Economistas e Consultores Independentes), que era uma empresa de consultoria, porque pedi ao meu diretor: eu quero trabalhar com processamento de dados, que era a expressão que se usava naquela época. Ele respondeu: “Isso ainda não é para nós”.

Deixei a empresa e fui trabalhar na Metal Leve. Comecei como programador, desenvolvendo um sistema integrado. O equipamento era um IBM 1620, só funcionava com cartões perfurados, não havia meios magnéticos. Posteriormente, fui para a Máquinas Bull, que me ajudou muito. Lá, trabalhei num bureau de serviços, e o gerente sempre dizia: “Quem trabalha num bureau de serviços não precisa passar pelo purgatório. É tanta desgraça, que São Pedro dispensa este sacrifício”.

Depois, fui para a ESC (Empresa de Sistemas e Computadores), uma subsidiária da Siemens, que comercializava o computador 4004 aqui no Brasil, concorrente de uma nova máquina da IBM, o /360. O equipamento da IBM, um sucesso estrondoso, era mais potente, com discos de alta capacidade, focado em teleprocessamento. O 4004 era uma máquina similar.

E isso aconteceu em 1970. Os Estados Unidos, em relação à informática, sempre estiveram um pouco à frente dos europeus. A Europa era mais bairrista. Na época, em cada país do Velho Continente havia um fabricante que dominava o mercado. Na França, era a Bull; na Inglaterra, a ICL; na Itália, a Olivetti; na Holanda, a Philips; na Alemanha, a Siemens e a Nixdorf. É claro que, apesar de os norte-americanos estarem à frente, os europeus lançaram tecnologias avançadas, como o CMC7. A Siemens tinha uma parceria com a RCA, norte-americana.

Vale lembrar ainda que, naquela época, Estados Unidos e Europa estavam envolvidos na grande briga do Concorde. Os europeus queriam lançar o avião supersônico para mostrar ao mundo que, tecnologicamente, eram mais avançados do que os Estados Unidos. O Concorde foi, realmente, um grande avanço, mas a relação custo-benefício não compensava.

Na ESC, o sistema foi evoluindo. Naquela época, eu já tinha editado o primeiro livro sobre informática em língua portuguesa, denominado “Introdução à Análise de Sistemas”. Comecei a escrevê-lo no final da década de 1960, em função dos cursos que ministrava. Inicialmente uma apostila, depois virou livro. Aliás, esta é a melhor maneira de se escrever um livro.

Quando meu diretor na ESC, Werner Kotch, viu o livro, disse: “Vamos transformar esse sistema integrado que você descreve aqui em um sistema real. Entregaremos juntos com o computador vendido pela ESC. Será um plus para os clientes”. Para mim, foi magnífico. Se, de fato, tivesse ocorrido, seria a primeira entrega de software livre, de graça.

A ESC teve um desfecho muito rápido. Em setembro de 1974, de um dia para o outro, sem aviso prévio, estávamos voltando de um cliente, quando recebi a notícia: a Siemens alemã decidiu encerrar as atividades da ESC no Brasil. Os equipamentos que mantinha no país, aproximadamente 30 máquinas, passaram a ser mantidos pela Univac (hoje Unisys). Isto até o final da década de 1980. O verdadeiro motivo da saída da ESC do mercado nunca se revelou claramente.

Independentemente do motivo, no dia seguinte, eu estava desempregado, com uma pequena indenização. Mas, como diz o velho e sábio ditado: há males que vêm para o bem. Era a época da reserva de mercado e eu estava com um sistema semipronto, pensando em vendê-lo como uma prestação de serviços. Pedi autorização ao Kotch para usar o sistema. Expliquei que pretendia montar um bureau de serviços. Ele autorizou e me “motivou”, dizendo ironicamente:

– É, se um dia funcionar, pode dar certo.

Naquele momento nascia o bureau de serviços SIGA – Sistemas Integrados de Gerência Automática Ltda. O que hoje denominamos ERP – Enterprise Resource Planning, ou seja, Planejamento dos Recursos da Empresa, uma evolução do MRP II – Manufacturing Resource Planning, Planejamento dos Recursos da Fábrica. É que o ERP também envolve a área financeira, RH, contabilidade, etc, etc. Estávamos em 19 de setembro de 1974. Em 1983 virou Microsiga e hoje é a TOTVS. Em 2010 nasceu o ERPFlex.

 

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